Comandante contradiz governo: “Muro do Bope” foi emboscada do CV no RJ.

Comandante do Bope contradiz governo e afirma que megaoperação no RJ foi emboscada do Comando Vermelho: “Agressividade inédita”

A crise em torno da megaoperação policial realizada no dia 28 de outubro, nos complexos do Alemão e da Penha, ganhou um novo capítulo explosivo neste domingo (16). Em depoimento ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), o comandante do Batalhão de Operações Especiais (Bope), tenente-coronel Marcelo Corbage, desmentiu publicamente a versão divulgada pelo governador Cláudio Castro (PL) e afirmou que os confrontos que resultaram em 121 mortos foram consequência direta de uma emboscada organizada pelo Comando Vermelho (CV).

O relato de Corbage, enviado pelo MPRJ ao Supremo Tribunal Federal, reforça a tese de que a operação — a mais letal da história do Rio — sofreu uma guinada inesperada e dramática após policiais civis na linha de frente serem surpreendidos e atingidos por criminosos fortemente armados. Segundo ele, tudo indica que o CV montou uma estrutura de guerra na mata conhecida como Vacaria, na Serra da Misericórdia, transformando o local em uma verdadeira fortaleza.

Versão oficial desmontada

A fala do comandante contradiz frontalmente a explicação do governo fluminense, apresentada no próprio dia da operação. Na ocasião, Castro afirmou que a tropa havia montado um suposto “Muro do Bope”, uma estratégia de contenção que cercaria a mata para impedir que os criminosos escapassem em direção às áreas urbanas — justificando, inclusive, a concentração dos confrontos fora das comunidades.

Mas, segundo Corbage, isso não condiz com a realidade. Ele afirma que o plano inicial não incluía o avanço até a região da Vacaria e que a incursão só ocorreu para retirar policiais civis feridos, já que havia risco iminente de execução. “Não havia previsão de subir a serra. A tropa só avançou para resgatar agentes atingidos”, afirmou.

Delegados da Polícia Civil confirmaram ao MPRJ que não existia ordem para operações dentro da mata. A entrada naquela área, segundo eles, ocorreu apenas após a identificação de movimentação criminosa, descartando completamente a narrativa de que havia um cerco planejado ou uma estratégia oficial chamada de “tróia”, como chegou a insinuar o governo.

Emboscada planejada e tática militar do CV

De acordo com o comandante, análises de imagens aéreas feitas pelo Bope revelam que grupos armados do Comando Vermelho se deslocaram de forma coordenada para dentro da mata, utilizando equipamentos de camuflagem e formação tática semelhante à de tropas militares.

“A intenção era preparar uma armadilha”, afirmou Corbage, destacando que os criminosos já estavam posicionados em estruturas fortificadas — verdadeiros bunkers — antes mesmo da chegada das equipes policiais.

O relato confirma que o CV, desta vez, agiu de maneira inédita. O grupo, segundo ele, sustentou intenso confronto por horas, resistiu de forma organizada e não recuou, comportamento que foge completamente ao padrão observado em ações anteriores. “A agressividade demonstrada fugiu a todos os padrões. Eles adotaram uma estratégia que nunca tínhamos visto”, declarou.

121 mortos e uma operação que mudou de rumo

Com cerca de 2.500 agentes envolvidos, a ação — batizada de “Operação Contenção” — registrou o maior número de mortos em uma única intervenção policial no estado. Familiares das vítimas lotaram o Instituto Médico-Legal nos dias seguintes, enquanto especialistas, defensores de direitos humanos e autoridades exigiam explicações do governo estadual sobre o elevado número de óbitos, a atuação na mata e os critérios de confrontos utilizados.

O depoimento de Corbage ao MPRJ fortalece a interpretação de que a operação, inicialmente planejada para cumprir mandados, se transformou repentinamente em uma missão de resgate após a emboscada.

“A partir dali, deixou de ser uma operação para cumprimento de mandados e se tornou uma operação de resgate”, explicou o comandante.

STF exige explicações do governo até o dia 17

Diante das contradições entre as versões do governo, da Polícia Civil e do Bope, o Supremo Tribunal Federal determinou que o governo do Rio de Janeiro apresente documentos, relatórios e esclarecimentos detalhados até esta segunda-feira (17). A Corte quer informações formais sobre o planejamento da operação, a cadeia de comando, as ordens dadas e as justificativas para atuação na região de mata — ponto que, agora, está no centro do conflito narrativo entre governo e forças policiais.

A decisão do STF cria pressão adicional sobre o governador Cláudio Castro, que já enfrentava críticas intensas pela condução da operação, pelos resultados trágicos e pela falta de transparência. Caso fique comprovado que a versão oficial foi usada para justificar erros estratégicos ou para encobrir falhas de comando, o caso pode escalar ainda mais politicamente e juridicamente.

Enquanto isso, o depoimento de Corbage repercute fortemente no estado e em Brasília, reacendendo debates sobre segurança pública, operações de alta letalidade e a presença cada vez mais militarizada do crime organizado. A narrativa do governo, até então dominante, encontra-se agora profundamente abalada — e novas revelações devem surgir nos próximos dias.

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